A Comunicação Corporativa é uma das áreas mais sensíveis e de difícil controle quando se trata do enquadramento das empresas nos requisitos da governança ambiental, social e corporativa, conhecida pela sigla ESG, do inglês “Environmental, Social, and corporate Governance”.
De acordo com a definição do Prof. Cees Van Riel, da Rotterdam School of Management, destacada por Daniel Medina da Prestige Consulting, a Comunicação Corporativa é um conjunto de atividades que envolvem a gestão e orquestração de toda a comunicação interna e externa de uma organização com o objetivo de criar pontos de vista favoráveis à empresa em todos os seus stakeholders.
As responsabilidades deste setor incluem áreas como relações públicas, relações com assessoria de imprensa, gestão da marca corporativa, comunicação interna, gestão das mídias sociais, relações com investidores e gestão de crises e da reputação corporativa.
Tais atividades no seu conjunto se enquadram na estratégica de comunicação de uma organização, vinculada à área de marketing, porém que permeia a organização como um todo. Todo um esforço deve ser dedicado aos canais oficiais da empresa para que o branding e o posicionamento do negócio sejam transmitidos de modo consistente ao mercado, e para isto pode-se contar com excelentes profissionais de marketing e comunicação com preocupação genuína para fazerem o bem pela sociedade onde estão inseridos, indo além da mera busca pelo lucro.
Novos negócios e startups costumam destacar os primeiros passos e o início da criação da empresa, num processo conhecido como “storytelling”, apontando erros e acertos, pois esta trajetória é inspiradora para todos que colaboram na busca de um propósito comum. Por outro lado, empresas maiores ou já maduras destacam outros momentos notáveis de sua trajetória empresarial, como o momento do aporte de capital de terceiros, abertura de capital no intuito de oferecer ações do negócio ao mercado (IPO) ou até mesmo o processo de sucessão empresarial, quando foram separados os herdeiros dos sucessores e a empresa conseguiu não apenas sobreviver como ter continuidade em sua geração seguinte.
O grande problema surge quando a expressão “storytelling” é traduzida para o português como contador de “estórias” e não de “histórias”! Ou seja, ao apresentar a organização ao mercado, a narrativa precisa necessariamente se basear em fatos verdadeiros e não inventados! No entanto, quando esta tarefa é delegada a pessoas ligadas à área de comunicação, comumente de perfil imaginativo e inventivo, é comum surgirem pérolas que podem colocar a credibilidade da organização como um todo sob suspeita!
Neste tipo de contexto, surgiram expressões um tanto polêmicas como “construção de autoridade”, e uso abusivo de Programação Neurolinguística (PNL) no intuito de promover propaganda enganosa e indução a erro. Fraudes nos mecanismos de busca direcionam clientes da concorrência para o próprio site. Vendas são colocadas num patamar acima de produção e organização. Multas abusivas sem respaldo econômico são inseridas nos contratos caso a parte perdedora se manifeste de modo desfavorável perante a outra parte. E aparecem pseudojornalistas com formação jurídica que afirmam conseguir excluir comentários negativos sobre a empresa na internet, como se esquecessem que tudo o que se publica na web deixa rastros e vestígios.
Para evitar tais deslizes, as organizações que contam com governança corporativa, composta seja por conselhos de administração, conselhos consultivos, diretoria, sócios e/ou demais stakeholders, precisam adotar uma postura guardiã do compliance. Ou seja, tudo o que for apresentado externamente sobre a organização deve ser auditável e comprovável.
Isto tudo pode parecer chato para os criativos mais agressivos e automotivados, que rotulariam esta turma grisalha como nota zero em imaginação! Mas este contraponto é o que se espera do grupo de aconselhamento de gestão, justamente para evitar os excessos da turma de perfil incendiário, que deseja vender a qualquer custo e receber sua comissão, porém sem uma nítida preocupação com o médio e longo prazo.
Ora, erros de comunicação podem afetar a reputação de uma organização, sua moral perante funcionários e colaboradores e até mesmo sua sobrevivência. E na atual velocidade das comunicações, isto pode acontecer de modo instantâneo em questão de segundos!
Em todo mercado existe as piores práticas, as boas práticas e as melhores práticas. O bom membro de conselho é aquele que age corretamente mesmo quando ninguém está olhando. Por outro lado, muitas organizações tiram proveito ao ingressar em setores ainda pouco regulamentados e obtêm vantagens e benefícios extraordinários ao agir de modo antiético e imoral, porém dentro da Lei. Elas contam com o risco de não serem notificadas e caso recebam multas ou punições, e calculam se serão brandas o suficiente para compensar o delito.
São inúmeras as empresas que cresceram cometendo gafes ou irregularidades ao longo de sua curva de crescimento. Quando não havia sócios nem terceiros a quem prestar contas, pecaram, enganaram e omitiram fatos e informações das formas mais diversas e imagináveis. No entanto, ao atingir determinada escala e etapa em seu crescimento, tais práticas passam a não ser mais toleradas. Foi dentro deste espírito que a Lei Sarbanes-Oxley foi criada nos EUA há 20 anos, na sequência do famoso escândalo da Enron, quando um pequeno grupo gerou um escândalo de grande proporção, levando inclusive a firma de auditoria responsável, à época a líder do mercado global em seu segmento, a mudar seu nome de Arthur Andersen para Accenture.
A internet ajuda a reavivar a memória. E o que dizer do publicitário que cuida da imagem da corporação e deixou passar uma frase presunçosa no sufixo da marca, afirmando que a empresa era a melhor do mundo em seu segmento, sem uma entidade que tenha concedido tal pretenciosa honraria? Ou do dirigente que colocou uma celebridade de perfil polêmico no conselho de uma instituição financeira, reposicionando-a como embaixadora da marca num segundo momento? E a empresa que passa uma imagem vencedora nas mídias sociais, porém não respeita os demais expositores em feiras, onde seu mau comportamento pode ser facilmente observado e sem filtros? A organizadora do evento pode ser enganada uma vez, porém não a segunda.
Na época da pandemia, qualquer coisa poderia ter sido publicada, inclusive informações fictícias com dificuldade de comprovação, as chamadas Fake News. Para tentar confundir a opinião pública e ter acesso ao mundo corporativo de primeira linha, naquele momento foi possível publicar que uma empresa que não cumpria os requisitos mínimos da CVM caminharia rumo ao IPO, caindo no descrédito e no ridículo uma vez desmascarados.
Há determinados setores que possuem restrições em sua comunicação no Brasil, caso de atividades ligadas à área de saúde como médicos e dentistas, além de advogados. Nos EUA, é possível ver outdoors contendo propaganda de escritórios jurídicos com mensagens do tipo: “- está pensando em se divorciar de seu cônjuge? Quando pensar nisso, lembre-se da gente!” Todo mundo sabe – ou deveria saber – que não se pode fazer isto no Brasil. Mas imagine por um momento que um jovem advogado faça algo nesta linha para atrair seu público e seja na sequência chamado a atenção pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). Ele modifica ligeiramente e altera seu anúncio 2 ou 3 vezes, até sofrer uma medida mais drástica e enérgica que de fato o impede de voltar a anunciar. Ora, até lá o advogado espertalhão já terá conquistado uma grande carteira de clientes, e poderá viver por anos ou até mesmo décadas do sobrelucro obtido a partir de sua atitude irresponsável nos tempos de sua juventude. Tal exemplo de lentidão e falha na Justiça explica muitas das peculiaridades que caracterizam a desigual sociedade brasileira e as empresas que transitam entre vários mundos que compõem o ecossistema de negócios.
Diante de tantos abusos, discute-se no momento a regulamentação do que pode ou não ser publicado na internet. Órgãos de fiscalização externos tem um trabalho infinito a cumprir junto a um oceano de empresas que operam na informalidade e sonegam, o que dificulta ou até mesmo impede seu crescimento. No entanto, costumam ter seu trabalho facilitado junto às corporações que seguem as regras da ESG e os princípios da boa governança com indicadores chaves de desempenho (KPIs), monitoramento e controle. São corporações que vão além da legislação de cada país e buscam fazer o que é certo num sentido societal mais amplo.
É preciso saber separar o joio do trigo. Devemos incentivar as melhores corporações a seguirem os passos de quem já passou pelo caminho das pedras e obteve seu prêmio, como o acesso ao mercado de capitais e ao mercado internacional, bem como comunicar e celebrar as brilhantes conquistas de quem chegou lá!
Daniel Alberto Bernard, 56, economista e Mestre em Administração pela FEA-USP, atua como consultor especializado em crescimento e desenvolvimento de empresas há 35 anos e é membro da Board Academy.