Segundo John A. Davis, fundador da Cambridge Family Entreprise Group (https://www.cfeg.com.br/bios/dr-john-a-davis) , professor no MIT e em Harvard e autor referência internacional no tema: “Família Empresária é aquela unida por vínculos decorrentes do patrimônio e do legado, capaz de se comprometer com o desafio de agregar valor para as próximas gerações, distinguindo as esferas da família, do patrimônio e da empresa, e agindode acordo com tal distinção.”
Segundo este autor, empresas familiares que se prepararam e evoluíram como famílias empresárias apresentam maiores índices de lucratividade, retorno sobre ativos e de valorização (valuation). Em decorrência de possuírem uma gestão mais profissionalizada com unidades de comando, conseguem mitigar os riscos e operam com maior transparência, na medida que dirimem os conflitos familiares e preservam o legado do fundador. Assim, possuem estratégias e gestão diferenciadas para os três ativos chave:
a) Família: Transmitem o legado na forma de valores baseados em união, fraternidade e respeito mútuos, permitindo e fomentando o desenvolvimento pessoal e profissional
b) Patrimônio: Focam na perenidade com usufruto justo, estruturam holdings familiares permitindo a proteção e a blindagem patrimonial
c) Empresa: Mantêm a organização com planejamento e desenvolvimento a partir de posicionamentos claros e com profissionalismo, evitando nepotismo e colocando a competência à frente da confiança. A Empresa passa a ser vista como um ativo a serviços de seus stokeholders, e não apenas a seus acionistas.
O tratamento da questão na esfera familiar envolve conhecimento em psicologia e sociologia para lidar com questões bastante emocionais, ao passo que as esferas patrimonial e empresarial requerem conhecimento em administração e na área jurídica para lidar com questões racionais.
Assim, segundo Manoel Knopfholz, criador do NGFE (Núcleo de Governança da Família Empresária), questões familiares contemplam temas como Conselho da Família, Código de Ética, Demarcação de status, Formação de Acionistas, Herança e Sucessão e criação de Holding familiar. Estas questões foram tratadas com muito cuidado no caso da IKA, empresa da família dele que sofreu muito quando foi encerrada. Por sorte e conveniência, eles tiveram a preocupação de proteger a marca registrada, que segue sendo usada e licenciada a terceiros, em que pese a fábrica de malas de viagem e bolsas tenha sido fechada há muitos anos.
Por outro lado, os aspectos mais objetivos e racionais costumam ter sua solução mais facilitada nestes casos, sobretudo uma vez superados os desentendimentos familiares: a criação de Holdings, a colocação em prática de um planejamento patrimonial com acordo de acionistas e investimentos bem distribuídos, com criação de um Family Office, são algumas das medidas a serem adotadas. Assim, uma vez implantada uma Governança Corporativa baseada em Princípios e Boas Práticas, a empresa poderá se beneficiar de um Conselho Consultivo ou até mesmo um Conselho de Administração, dependendo de seu porte e enquadramento legal.
Pode-se afirmar portanto que a Família Empresária enquanto conceito é a Empresa Familiar que deu certo e evoluiu, superando os obstáculos na transição entre gerações! Desta forma, o grupo se organiza de modo a preservar as relações de família, ao mesmo tempo que não somente promove a continuidade e lucratividade das empresas como preserva e aumenta o patrimônio da família, o que resulta numa maior integração entre as gerações.
Lamentavelmente, empresas conduzidas por Famílias Empresárias são minoria na realidade brasileira. Segundo dados levantados pelo SEBRAE e pelo IBGE em setembro de 2021, cerca de 90% das empresas nascem familiares, porém 70% não sobrevivem à geração do fundador e menos de 5% chegam à terceira geração. Este é um grande problema para o ambiente empresarial brasileiro, pois empresas familiares representam cerca de 65% do PIB brasileiro e 75% dos empregos gerados.
As empresas familiares brasileiras foram em sua maioria criadas por necessidade e não por oportunidade, na linguagem popularizada pelo SEBRAE. Buscam inovar e trazer diferenciais competitivos, porém em sua maioria não adotam modelos de negócios originais e preferem estruturas organizacionais centralizadas e conservadoras, com visão mais de curto e médio prazo focada no valor do investimento inicial e na busca do mais rápido retorno sobre o investimento possível, e com pouca preocupação com a durabilidade e longevidade do negócio. Empresas com conceitos originais concebidos por seus fundadores e com sólidos diferenciais são aquelas mais resistentes à concorrência, sobretudo caso tenham obtido crescimento em escala ao longo de sua existência. São pontos chave que caracterizam negócios feitos para durar a sua escalabilidade e a ausência da dependência do fundador.
Assim, o elevado nível de empreendedorismo no Brasil paradoxalmente não se reflete na maioria dos casos na criação de empreendimentos sólidos e duradouros. Segundo pesquisa da consultoria PwC elaborada em 2019, estima-se que cerca de 3/4 das empresas familiares no Brasil encerrem suas atividades por problemas sucessórios. Este tema foi abordado na obra “Xeque-mate: Descomplicando a Sucessão Empresarial e Proteção Patrimonial por meio do Seguro de Vida” de Tiago Melo, publicada naquele ano.
Segundo o especialista brasileiro Renato Bernhoeft: “todo empreendimento surge como uma entidade viva que, na sua origem, está vinculada à figura do seu criador. Criatura e criador se confundem por longo tempo. Para que ambos, criador e criatura, sigam seus caminhos de forma positiva é que a sucessão deve ser encaminhada na perspectiva da continuidade. Ou seja, de vida, e não de ausência.” Ele ainda define (BERNHOEFT, 1989) que “pelo foco da gestão, são consideradas empresas familiares aquelas organizações que têm seus cargos diretivos ocupados pelos seus próprios membros, escolhidos a partir de laços de sangue e da reciprocidade da confiança entre os mesmos.”
Já Dave Ulrich (1997) aponta que “Num sentido mais amplo, a empresa familiar se define como aquela cuja propriedade e administração no sentido do controle sobre as decisões operativas estão nas mãos de uma ou mais pessoas da família.”
O planejamento sucessório e a criação de holdings para proteger os negócios de família envolvem uma significativa economia em despesas com inventário e advogados. Infelizmente, a paralisia e intenção de não fazer nada pois algo parecido com uma “mão invisível” cuidará de tudo não funciona nestes casos! Sempre haverá alguém que manifestará este tipo de opinião quando o assunto chegar na família, porém será necessário acionar o senso de urgência, sobretudo dependendo da idade e do estado de saúde dos envolvidos. Os valores despendidos a serem antecipados não devem ser entendidos como uma despesa e sim como um investimento no futuro, além de evitar discussões e desentendimentos na família.