Quando se inicia a expansão de uma rede de franchising, geralmente o relacionamento entre o franqueador e os primeiros franqueados ocorre de modo muito próximo, num ambiente com intensa troca de informações e experiências. Na expectativa do franqueador, que sonha em desenvolver uma rede com dezenas, centenas ou até mesmo milhares de unidades, grandes números e as perspectivas decorrentes de um negócio bem formatado e de um potencial de mercado claramente mapeado o incentivam e motivam. Uma vez elaboradas as ferramentas de planejamento, organização e controle no decorrer do processo de formatação, o plano de negócios irá detalhar também as expectativas de expansão da rede e a estrutura necessária para a colocação em prática deste plano de expansão.
COMERCIALIZAÇÃO E GESTÃO DE REDES NEM SEMPRE CAMINHAM JUNTOS
No entanto, é comum que muitos franqueadores se frustrem na execução de seus planos de expansão e manutenção da rede. Ora, embora no papel tudo possa parecer perfeito, na prática, tudo se inicia com a obtenção efetiva de “bons resultados concretos” pelos primeiros franqueados. Bons resultados concretos costumam ser percebidos e medidos na visão dos franqueados sobretudo a partir do atingimento do ponto de equilíbrio no prazo mais curto possível, com faixa de faturamento atingida conforme as características do ponto comercial selecionado e pelo perfil dos gestores, e alavancado a partir do resultado das ações de marketing de lançamento. Assim que o franqueado comprove que o negócio está de fato proporcionando lucratividade e rentabilidade dentro ou acima do esperado, tal constatação elevará o grau de satisfação e superação das expectativas dos primeiros franqueados piloto. E este processo é o que há de mais importante nesta etapa, afinal os franqueados piloto serão o espelho dos demais franqueados que se juntarão à rede! Ora, caso os primeiros franqueados não obtenham bons resultados, eles podem bloquear o ingresso de novos franqueados na rede a partir de relatos e depoimentos negativos, ou mesmo encerrar prematuramente suas atividades, e isto pode levar a rede a interromper sua trajetória de crescimento por pelo menos 2 anos, ou até mesmo de modo irreversível e permanente.
Os “últimos 24 meses” é o prazo previsto na Lei 13966 de 2019 para que franqueadores mencionem na Circular de Oferta de Franquia (COF) os casos de encerramento de unidades franqueadas da rede. Já as melhores redes não se limitam a este prazo mínimo e seguem o princípio da transparência (disclosure), informando todas as unidades da rede que encerraram suas atividades a qualquer tempo, e sobretudo, na praça onde um novo franqueado pretenda abrir sua unidade. Afinal, seria uma desagradável surpresa para um franqueado descobrir por meio de clientes e não por meio do franqueador que a marca já teria operado em sua cidade no passado! O apagador de memória do MIB (Men In Black) parece não atender aos interesses dos franqueados, e este é somente um exemplo de ponto a suscitar polêmica.
QUANDO CRIAR UM CONSELHO DE FRANQUEADOS
A partir desta breve introdução, surge a pergunta fatídica: e quando a rede cresce e já possui uma quantidade representativa de franqueados, o que acontece no relacionamento franqueador-franqueado? Sim, ele deixa de ser tão pessoal, pois passa a não haver mais tempo disponível pela pessoa do franqueador líder de rede para manter um relacionamento tão próximo com cada franqueado individualmente. Alguns franqueadores conseguem dar conta pessoalmente de dar suporte a uma rede de até 7 unidades, reservando na sua mente um dia por semana para dar atenção a cada unidade. Outros acreditam que conseguem fazer isto com até 30 unidades, como se pudessem reservar um dia por mês ao acompanhamento à distância e monitoramento das unidades da rede. Este limite depende muito do estilo de liderança do franqueador e das ferramentas que utilize neste processo, incluindo seu celular e seu whatsapp, e o software de gestão utilizado. Mas para dar sequência à sua expansão ele precisará contratar pessoas competentes e de confiança, alinhados com a cultura da organização, e e criar blogs, fóruns e reuniões online. Estas reuniões com a rede contarão geralmente com a presença obrigatória de todos os franqueados, sendo esta inclusive uma condição que costuma estar prevista em contrato.
No entanto, chega uma certa altura na qual os temas vão se tornando tão complexos e específicos que deixa de ser interessante para todos os franqueados participarem de todos os encontros, que acabam se especializando em temas específicos, relacionados por exemplo à publicidade, à tecnologia, ao desenvolvimento de novos produtos, a mudanças na legislação. Neste momento, o grupo de franqueados pode entender que vale a pena eleger representantes, geralmente entre 5 e 25 franqueados, para ficarem à frente desta interação mais intensa entre eles e o franqueador. É neste momento que surge a necessidade de se criar um Conselho de Franqueados e comitês!
O PROPÓSITO DE UM CONSELHO CONSULTIVO DE FRANQUEADOS
O propósito de um Conselho de Franqueados consiste em criar um ambiente físico e/ou uma plataforma virtual na qual os franqueados são convidados a compartilhar e a discutir ideias, ações e procedimentos com a equipe de apoio da franqueadora. O franqueador geralmente participa como um observador, e permite que os franqueados compartilhem suas melhores práticas mercadológicas, gerenciais e operacionais entre eles. No entanto, o franqueador não tem a obrigação de tomar qualquer medida ou ação decorrente destes encontros, que tem caráter consultivo e não deliberativo. Portanto, a nomenclatura correta seria “Conselho Consultivo de Franqueados”.
Por outro lado, é claro que as sugestões do Conselho trazem consigo um real potencial de agregação de valor no aprimoramento da rede, e sempre que colocadas em prática, proporciona confiança e segurança entre as partes. É a melhor forma dos franqueados trazerem contribuições positivas e coletivas à rede e abrir possibilidades de conexão e colaboração multilateral no formato de network.
Um Conselho de Franqueados, ou “Franchisee Advisory Council” no seu equivalente na língua inglesa, pode ser criado de modo informal, mas pode ser formalizado e ter inclusive um regulamento para maior clareza e segurança das partes. Ele é sempre proposto pelo franqueador, e tem fins consultivos e não deliberativos, afinal o poder de decisão final sempre caberá ao franqueador, do contrário o modelo de negócios seria descaracterizado, e o negócio se transformaria numa cooperativa por exemplo, onde é necessária a aprovação de todos por unanimidade para a tomada de qualquer decisão, o que bloquearia e tornaria menos ágil esta organização.
Jamais deve ser confundido um “Conselho de Franqueados” com uma “Associação de Franqueados”. Uma Associação de Franqueados é proposta pelos franqueados para fins reivindicatórios, quando a rede parece não ser ouvida e os franqueados se juntam para pressionar o franqueador a tomar decisões aparentemente desfavoráveis a ele, mas que são entendidas como necessárias e importantes para a rede como um todo pelos franqueados. A Associação de Franqueados mais conhecida do Brasil é a dos Correios, cuja rede teria sido extinta não fosse a intervenção desta entidade. Ora, por se tratar de franquia público-social cujo formato não foi regulamentado pela Lei 8955/1994, todos os anos a rede temia não ter seu contrato renovado, devendo ser tomadas medidas legais especificas para a renovação e continuidade da atividade. A Lei 13966/2019 ajudou mas não resolveu totalmente a questão.
REDES INTERNACIONAIS COM BONS CONSELHOS DE FRANQUEADOS
Há diversos Conselhos de Franqueados que se tornaram muito conhecidos e relevantes para o sucesso de suas redes. Dentre as redes internacionais, destacamos:
· CENTURY 21
· CHOICE HOTELS
· DUNKIN DONUTS
· HOLIDAY INN
· JANI KING
· KFC
· MAIL BOXES
· Mc DONALD’S
· MIDAS
· SONIC
· UNIGLOBE
· WENDY’S
REGULAMENTO DE UM CONSELHO DE FRANQUEADOS
Detalhamos a seguir algumas sugestões que podem constar no regulamento de um Conselho de Franqueados.
1 – Objetivos do Conselho de Franqueados:
I – Definir e sugerir métodos de utilização de publicidade compartilhada mediante o uso da Marca.
II – Promover o profissionalismo entre os Membros do Conselho e entre os respectivos colaboradores a estes relacionados.
III – Facilitar a comunicação entre os membros e aumentar o número de relações comerciais entre os membros da rede no Brasil ou em nível global.
IV – Disponibilizar um fórum para que toda a rede tenha ciência de práticas desempenho profissional excepcionais dos Membros do Conselho.
V – Discutir todo e qualquer programa que possa gerar variações na lucratividade do negócio (exceto alterações de preço)
VI – Disponibilizar um fórum para que possibilite educar e treinar os Membros do Conselho e a rede como um todo.
VII – Emitir pareceres e promover as melhores oportunidades de negócios para a rede como um todo, objetivando ganhos de lucratividade tanto para o franqueador como para os franqueados.
VIII – Criar assembleias para organizar e maximizar as oportunidades e os benefícios do Conselho referentes a propaganda e marketing coletivos, bem como para compartilhar ideias inovadoras destinadas a expandir a visão de desenvolvimento comercial.
IX – Sugerir alterações que resultem no aperfeiçoamento do relacionamento entre franqueador e franqueado, franqueado e fornecedores ou entre franqueados e seus clientes finais, incluindo a criação de comitês ou comissões para discussão de pautas específicas.
X – Conflitos serão resolvidos caso a caso: primeiro em nível regional; caso não dê certo, chamará o escritório corporativo, ou nomeará a associação como sua defensora, buscando sempre soluções consensuais.
Outros aspectos a considerar:
· Elegibilidade
· Direitos e deveres
· Comitês (nacionais e/ou regionais)
· Condução das reuniões
· Comunicação
· Eleição dos franqueados que representarão a rede nas reuniões de conselho
· Prazos de mandato
ALGUNS RESULTADOS EXTRAORDINÁRIOS:
O Conselho de Franqueados também pode resolver questões relacionadas ao não pagamento ou pagamento a menor de royalties. Caso o franqueado declare um volume de vendas menor do que o efetivamente realizado, o Conselho deixará de defender o franqueado em qualquer questão que lhe diga respeito. De certa forma, tal franqueado passaria a ser discriminado e posto de lado pelos próprios franqueados que cumprem religiosamente suas obrigações financeiras.
De início, os custos de transporte e estadia dos membros do conselho consultivo dos franqueados podem vir a ser pagos pelo franqueador. A partir de determinado momento, os franqueados podem decidir bancar tais despesas às suas próprias custas, ou preferir concentrar boa parte ou até mesmo todas as reuniões no formato online. O desempenho do conselho de franqueados é um dos segredos do sucesso do negócio.
Há redes que não oferecem formalmente exclusividade territorial, porém situações polêmicas são levadas ao Conselho de Franqueados, o que ocorre na rede Midas, líder do segmento de undercar services system.
O QUE NÃO FAZER
· Não adianta criar um Conselho de Franqueados sem propósito definido ou sem metodologia adequada.
· Jamais sugerir aos franqueados que mintam e “não lavem a roupa suja fora de casa” em troca de prêmios e reconhecimento externo para a rede. Além de antiético, soa falso!
· Não adianta motivar os franqueados com shows de ilusionismo ou deixando-os eufóricos sem exemplos concretos de sucesso baseados na própria curva de experiência que possam ser repetidos por eles. É sempre bom conhecer exemplos de sucesso de outras redes. No entanto, o que deu certo numa rede nem sempre funcionará em outra.
· Manter franqueados satisfeitos em redes que focam na comercialização e não no suporte de gestão é algo que só funciona para os franqueados com capacidade de se autogerenciarem.
CONCLUSÃO
Se sua rede vende 100 franquias e fecha 75 significa que seu processo de comercialização é eficiente, porém precisa corrigir seu processo de suporte de gestão para reter franqueados na rede. Um Conselho de Franqueados bem estruturado, ativo e motivado ajudará muito neste processo!
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