Atuo com consultoria há 36 anos e já passei pelas situações mais diversas que o leitor possa imaginar… Dentre todos os desafios que enfrentei, diria que sem dúvida ter de lidar com as incertezas decorrentes da crise gerada pela COVID-19 foi a situação mais impactante vivenciada por mim e por todos de minha geração!
Olhando para trás e analisando as estatísticas, Segundo Ahir, Bloom e Furceri (2022), pesquisadores do FMI e Stanford (Bloom), o World Uncertainty Index aponta a COVID-19 como o elemento pontual desde 1990 que mais gerou incertezas em nível estrutural no mundo.
Ver conteúdo disponível em https://www.nber.org/system/files/working_papers/w29763/w29763.pdf
Como lidei pessoalmente com a crise? No dia 19 de março de 2020 a maioria das empresas parou de operar. No dia 20, uma cliente que deveria quitar uma parcela relativa a um serviço de consultoria nos ligou e informou que estava de posse dos recursos necessários para nos quitar. No entanto, disse que não queria pagar o valor naquele momento. A razão é que ela estava com MEDO, paralizada diante da incerteza que pairava sobre todos nós naquele momento.
Logo percebi que aquele cenário não era pontual e sim sistêmico. Como acompanho tudo o que acontece no Brasil e no mundo de modo permanente, em função de meu perfil poliglota e fã de viagens (leio em 7 idiomas e estive em 45 países antes dos 30 anos de idade) e movido pela mais pura curiosidade, já estava acompanhando o problema que vinha da China desde janeiro daquele ano. Quando o problema de fato atingiu o Brasil, já estava bem ciente do que estava acontecendo e poderia acontecer, embora desconhecesse a magnitude que a pandemia poderia atingir.
Imediatamente liguei para o proprietário da Stone, que havia conhecido recentemente. Expus o problema da minha cliente, e ele já tinha uma solução pronta na manga: todos os comerciantes que possuiam uma maquineta de cartão de crédito deles poderia adquirir ao custo de módicos R$ 40 o serviço Parcele Já da Cappta, empresa do grupo, que permitia parcelar contas ainda não vencidas na forma de boleto. Assim, um aluguel de R$ 5 mil por exemplo, poderia ser parcelado via maquineta em até 12 vezes, numa taxa de juros atraente (e nós pudemos opinar e reduzir algumas vezes esta taxa, na medida que somos correspondentes bancários desta e de outras 11 instituições de crédito), utilizando o limite de crédito somado de até 9 cartões. A parcela caía para R$ 500 e sobrava R$ 4.500 para capital de giro!
Repassei esta informação para minha cliente (que quitou desta forma nosso valor) e para mais de mil empresas, estou certo que o acesso a esta informação pontual ajudou muita gente! Afinal, muita gente pensou em buscar crédito no banco, porém sem experiência, ficou a ver navios… O governo liberou o PRONAMPE depois de algum tempo, uma linha de crédito que todos deveriam aproveitar ainda que naquele momento não estivesse precisando de capital de giro. O gerente de nossa agência informou que havia ligado para 256 clientes oferecendo a linha de crédito, porém somente 16 deles contrataram o crédito!
No dia 4 de março de 2020 nossa cliente da rede Tereza Zanchi Shiatsu & Bem Estar me convidou para participar de uma live na qual ela me entrevistou. O titulo da live foi “Práticas para enfrentar os Desafios frente ao COVID-19 na Gestão de Negócios e nas Redes de Franchising”.
Naquela ocasião, preparei diversas informações que havia identificado em publicações internacionais e nos relatos que ouvi.
Iniciei pontuando que a origem do problema era de saúde pública porém afetaria toda a economia mundial. Nossa live abrangeu desde os efeitos macro e microeconômicos até chegar no nível individual, com orientações voltadas para o bem-estar dos ouvintes, destacando ações que franquias e negócios em rede estão adotando, destacando a importância de se estar vinculado à busca de conhecimento, gestão e solidariedade! Focamos em ideias e soluções práticas para enfrentar o momento.
A COVID-19, nome da pandemia resultante do novo coronavírus, teve seu primeiro caso registrado em 31 de dezembro de 2019 em Wuhan na China. Em pouco tempo, já havia atingido mais de 1 milhão de infectados. Em 01-04-2020, o Secretário Geral da ONU Antonio Guterres declarou ser este o maior desafio da Humanidade desde a Segunda Guerra Mundial!
Como a pandemia estava afetando o ecossistema de negócios?
A crise teve sua origem num problema de saúde porém a paralização das atividades empresariais (quarentena/ lockdown) acabou gerando um problema econômico de grandes proporções, com queda abrupta do PIB e caracterização de uma depressão econômica.
Sim afetou a macroeconomia e também cada negócio individualmente, sem exceção, com impacto distinto dependendo do setor de atividade, do porte da empresa. A roda da economia parou de girar!
A paralização no sentido macroeconômico:
Ações do governo, que injetou naquele momento mais de R$ 700 bilhões no mercado, com foco em:
– Adiamento dos impostos visando a preservação do emprego
– Empréstimos subsidiados por intermédio do BNDES, bancos privados e operadoras de cartão de crédito
– Ajuda humanitária aos mais necessitados, com distribuição de recursos a fundo perdido
A paralização no sentido microeconômico, pensando em cada empresa:
A redução ou interrupção total do faturamento, portanto na medida que o fluxo de caixa foi prejudicado, resulta em:
– Busca por soluções paliativas: e-commerce, delivery, to go, drive-thru
– Busca por redução dos custos operacionais
– Uso de reserva de capital e/ou busca por capital de giro
Quais os setores mais afetados positiva e negativamente no curto prazo?
Destaque para setores mais bem organizados: ABF, ABRASCE, ABRASEL
Cases positivos mundiais: Zoom, Tik Tok
Cases positivos: Web services, empresas de delivery
Demissões: 20 a 30% ABRASEL, mediante queda do faturamento de 50 a 90% em março de 2020
Fundos de investimentos cancelaram a distribuição de dividendos
Riscos: Fake News, acompanhamento de notícias distorcidas pelos jornais, TV, mídias sociais, excesso de ações de marketing digital. O antídoto seria buscar fontes de informação seguras e confiáveis, e contar com bons mentores! Naquele momento, quem pudesse contar com consultores, conselhos consultivos ou conselhos de administração estava menos apavorado do que as demais pessoas mal informadas ou até mesmo desinformadas!
Alguns exemplos de ações que vinham sendo tomadas por franqueadores, franqueados e fornecedores
– A franqueadora JAN-PRO, com mais de 400 unidades espalhadas pelo Brasil, estava com um equipamento importado que desinfecta ambientes contaminados por coronavirus com índice de eficiência de 99,99%
– A Medicalway é uma importadora e distribuidora de respiradores artificiais para UTIs. Desenvolvemos a missão, visão e valores da empresa. Ela tem por missão oferecer um atendimento digno à população, oferecendo sempre o melhor equipamento disponível no mercado! Pois quando se usa o equipamento, a vida do paciente depende da qualidade do equipamento, da resistência de seu organismo e de Deus. Grupos de franqueadores estão se juntando para doar respiradores artificiais
– O Boticário doou toneladas de Alcool em Gel à Secretaria Municipal de Saúde de Curitiba
– McDonald´s estava distribuindo lanches e álcool em gel a caminhoneiros
– Home Angels teve sua demanda aumentada de home care. Como os hospitais lotados, houve aumento de demanda a partir do décimo dia da contaminação.
– Uso de reserva de capital e/ou busca por capital de giro para parcelamento dos custos fixos (ex. Stone/Cappta/Parcele Já)
– A Neurometria do Dr. Nelson Alves Pereira Junior permite otimizar nossa saúde e capacidade mental e de concentração, abalada em momentos de crise.
– A Escola Conquer do Josef Rubin ofereceu gratuitamente um curso de Inteligência Emocional que custaria normalmente R$ 1.960. Obteve 100 mil inscritos em 1 dia e meio e passou de 25 mil alunos presenciais para cerca de 4 milhões de alunos durante a pandemia! Com o tempo, acabou recebendo um significativo aporte de capital por parte de Flávio Augusto dono da Wiser Up.
– Katja Guimarães, a pessoa que me entrevistou e que mora no Texas, destacou que ofereceu inúmeras mentorias gratuitas para pequenos empresários.
A dificuldade de um pode ser a solução já encontrada por outro!
E o Pós-COVID? O que vinha na sequência? A retomada seria lenta ou rápida?
Esta foi a pergunta mais intrigante da entrevista. O impacto não seria o mesmo para todos os setores da economia: muitas empresas iriam parar suas atividades de modo temporário ou permanente. Alguns negócios não sentiram impacto. E poucos negócios tiveram um aumento de demanda diante deste cenário de caos incerteza: são os negócios denominados antifrágeis, na linguagem de Nassim Nicholas Taleb. O livro Anti-Frágil – coisas que se beneficiam do caos, publicado em 2012, parecia caber como uma luva naquela circunstância! No livro A lógica do Cisne Negro, o autor demonstra que acontecimentos altamente improváveis e imprevisíveis dominam a nossa existência. Assim a incerteza deveria ser percebida como algo desejável e até mesmo necessário. Assim, o antifrágil iria além do resiliente e robusto, se tornaria ainda melhor ao ser protegido de eventos adversos.
Por este raciocínio, farmácias e supermercados teriam sua demanda aumentada durante a pandemia, assim como restaurantes com serviços de delivery e To Go, negócios online e aqueles voltados para pequenas reformas na casa das pessoas, onde elas permaneceriam por mais tempo. Haveria aumento na quantidade de reuniões por videoconferência e redução na necessidade de deslocamentos. Um dos negócios que mais demoraria para se recuperar seriam os cinemas em shopping. Por outro lado, serviços de consultoria tiveram um pico de demanda, nossa empresa triplicou seu faturamento em 2021!
Uma vez tendo acesso a esta informação, a sensação de pânico dava lugar à perspectiva de um cenário administrável e negociável.
A Arezzo passou por uma situação extraordinária naquele momento. Anderson Birman informou publicamente que tomou café com seu filho Alexandre e o alertou a tempo sobre as notícias. Eles brincam que foi uma espécie de “reunião de Conselho”, pois o pai já havia delegado muitas de suas funções operacionais e sobrava tempo para acompanhar as notícias. Eles estavam com um bom capital de giro e dobraram este capital contraindo empréstimos quando os bancos ainda estavam com muitos recursos disponíveis e baratos. Veio a crise e as lojas fecharam, mas rapidamente criaram um software e passaram a atender a carteira de clientes online, buscando estoque nas lojas e entregando em mãos. Eles se viraram muito bem com a crise, sobraram recursos e forma às compras, adquirindo dentre outros ativos a Reserva, tornando-se desta forma o maior grupo brasileiro no seu segmento de Moda!
Ao longo deste episódio no qual prevalecia a mais extrema incerteza, sobretudo quando ainda não tinhamos uma vacina ou proteção segura, olhando para trás, prevaleceu nossa capacidade de adaptação rápida, bem como aquela dos nossos clientes que se recuperaram na forma gráfica de U, e não em K. Percebemos tanto clientes excessivamente otimistas como também em estado de depressão e com a saúde mental abalada. Informações conflitantes deixaram muitas equipes esgotadas, paralizadas e sem rumo. Ficou clara a percepção de interdependência entre as pessoas, as equipes e as nações, pois um problema do outro lado do mundo passou a afetar toda a população do Planeta Terra! E lamentavelmente nada impede que novos desafios como este voltem a ameaçar o planeta num futuro próximo…
Numa circunstância tão extrema como a descrita, Conselhos Consultivos e Conselhos de Administração passaram a ser ainda mais valorizados pelas organizações. Deixaram de ser vistos meramente como responsáveis por tarefas básicas como compliance e de fato passaram a repercutir a cultura das organizações, com agilidade e com foco na antecipação do futuro. Na sua configuração mais avançada, o Conselho trabalha em equipe com foco em comportamentos indo além dos processos na busca pelas melhores práticas, e está aberto a desafios num ambiente seguro e confiável.